domingo, 15 de junho de 2008

Portugal recusa mudança de BI a transexual luso-canadiana

Por três vezes as autoridades portuguesas recusaram a C.J. a mudança do BIC.J. nasceu em Lisboa, mudou-se para o Canadá, e foi neste país que decidiu mudar de sexo, submentendo-se à cirurgia respectiva. Na posse de um certificado da clínica que executou a operação, pôde alterar o nome e o sexo em toda a documentação emitida no Canadá, mas as autoridades portuguesas negaram-lhe por três vezes um BI de mulher. O seu advogado diz que se a situação persistir vai recorrer a todas as instâncias possíveis, até ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Um luso-canadiano que mudou de sexo exigiu esta semana ao Conservador dos Registos Centrais e ao Ministério da Justiça um bilhete de identidade (BI) português que o reconheça como mulher, informa a Agência Lusa.
C. J., empresária com dupla nacionalidade, 47 anos, submeteu-se a uma cirurgia para mudança de sexo há 16 anos, num hospital de Montreal, no Canadá. Na posse de um certificado da clínica que executou a operação, pôde alterar o nome e o sexo em toda a documentação emitida no Canadá - incluindo cartões bancários, de identificação fiscal e até o passaporte -, mas as autoridades portuguesas negaram-lhe por três vezes um BI de mulher. "A Administração portuguesa forçou-me a ser duas pessoas", indignou-se a transexual.
O argumento utilizado pelas autoridades portuguesas, no Consulado de Portugal no Canadá ou nas conservatórias portuguesas, foi sempre o mesmo: "não existe no ordenamento jurídico português uma lei equivalente à canadiana".
Pedro Mendes Ferreira, advogado de C. J. reconheceu que em Portugal "não há lei que diga expressamente que se pode alterar o sexo", mas contrapôs uma interpretação "mais abrangente" do quadro legal, "que não pode ignorar o princípio fundamental constitucional da dignidade da pessoa humana". E avisa que não desiste desta batalha jurídica que passará pelo recurso ao Supremo Tribunal de Justiça e provavelmente até ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
No requerimento dirigido ao Conservador dos Registos Centrais e ao Ministério da Justiça, C.J. defende que o chamado "sexo registral" de homem não se justifica para ela, na medida em que realizou a retirada dos órgãos masculinos através da designada "cirurgia de redesignação sexual". E acrescenta que se a medicina já resolveu o seu sindroma da identidade sexual, cabe agora ao Estado "permitir que o requerente adeqúe o seu sexo jurídico ao aparente", dado que "os factos devem impor-se ao Direito e à rigidez do registo civil".
A recusa da pretensão fará com que o requerente fique "ferido na sua dignidade, bem como na sua honra, na sua capacidade civil, cidadania, bom-nome, reputação, imagem e na protecção legal contra quaisquer formas de discriminação", pode ler-se ainda no texto..
Num acórdão de 22 de Junho de 2004, o Tribunal da Relação de Lisboa concluiu que "não se conhece norma que proíba a mudança voluntária de sexo", mas constata-se "a existência de uma lacuna no sistema jurídico português relativamente à possibilidade jurídica de mudança de sexo".
A lacuna na lei portuguesa "significa que cada pessoa transexual, mesmo depois da transição clínica, é forçada a viver numa espécie de limbo, em que a sua documentação especifica o sexo atribuído à nascença, quando esse sexo não tem correspondência com a sua fisionomia e com a sua identidade", lamentou associação Ilga Portugal, num comunicado de 1 de Março de 2007.
Em Espanha, as Cortes aprovaram em Março do ano passado uma lei que permite a transexuais alterar o sexo e o nome no Registo Civil, sem precisarem sequer de recorrer a cirurgia.

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