quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Política Municipal para o ambiente


Intervenção do Deputado Municipal de Bragança Luis Vale, na Assembleia Municipal de Bragança de 9/02/2009;

Exmos. Senhores,

Em boa hora foi proposta esta discussão acerca da política municipal para o ambiente e por isso felicito o grupo municipal da CDU. É que falar de ambiente municipal e das suas políticas pressupõe:

1º - Ter a noção de que será, na prática, falar acerca de tudo o que diz respeito ao município;



2º - Ter consciência que é necessário haver uma reflexão, um planeamento, uma prática à qual se possa dar, então e depois, o nome de política ambiental;


Ao reflectir sobre esta questão e tendo em conta o território em questão e o limite do meu tempo, vou-me reportar apenas a dois exemplos daquilo que consideramos ser paradigmáticos de uma má política ambiental.Primeiro exemplo - basilar:


A questão do básico saneamento – para quando a conclusão desta básica infra-estrutura!?... Quantos mais anos serão precisos para a concluir!?...


Quantos mega-projectos vão ser projectados, planeados, financiados, hipotecados e construídos antes dessa simples, mas fundamental e justa estrutura estar completa no concelho de Bragança. É inadmissível num concelho como o de Bragança que se orgulha de tamanho desenvolvimento eque se auto-notabiliza pelos índices de qualidade de vida, manter parte do seu território e das suas populações sem saneamento básico. Meus Senhores e minhas senhoras, é BÁSICO, ou seja, é sobre ele que assentam todas asoutras qualificações e qualidades da nossa civilização de século XXI.


Vejam bem… aqui a questão não é estar contra ou não a implementação desse parque, até porque o Bloco de Esquerda sempre defendeu e defende a substituição das energias fósseis e finitas. A pertinência desta questão está no processo, que quanto a nós foi muito mal gerido e conduzido pela Câmara Municipal e pelas respectivas Juntas de Freguesia, naquilo que entendemos ser a defesa do interesse público e das respectivas populações, ou seja, as autarquias locais em causa prestaram um mau serviço à causa pública, senão vejamos:


a) No período de discussão pública, a Câmara Municipal de Bragança não teve em atenção os impactos negativos relatados, designadamente o turismo de natureza e rural onde estão incluídos os animadores turísticos, a restauração e a hospedagem;


b) A C.M. não teve a mínima noção de que poderia estar a castrar o sucesso actual e futuro do turismo de natureza – elemento fundamental das próximas sociedades;


c) A C.M. não conhece o potencial eólico do concelho;


d) A forma como as Juntas de Freguesia celebraram acordos com empresas privadas não garante a defesa do interesse das suas populações;


Aqui estamos precisamente no ponto ao qual queremos dar ênfase. O da negociação realizada pelos autarcas do concelho e o interesse privado dasempresas do sector. Tendo em conta a informação que recolhemos junto de três vários intervenientes, ficamos a saber que foi mais ou menos assim que tudo aconteceu:


· Tudo terá começado com a visita de umas pequenas empresas aoterritório. Disse pequenas, mas quero também dizer espertas. Estes espertos andaram de aldeia em aldeia a tentar negociar os direitos de exploração de potencial eólico;


· Mais tarde, subiu-se um degrau e começaram a aparecer empresas de dimensão média, por exemplo, a Enerbaça, directamente ou comprandoa essas pequenas empresas espertas, terá conseguido 14 ou 15 acordos locais;


· Mais tarde ainda, entram em cena as poderosas empresas como aAirtricity (empresa de uma holding da Grã-Bretanha – SSE, onde participa também a Iberdrola) que consegue fazer uma jointventure coma Enerbaça e esta passa a ter uma posição minoritária… o know-howestá todo na Airtricity;


· Aqui entra a C. M. que chama a si todo o processo e passa a negociar com a empresa;
Em nosso entender, começam aqui também os graves procedimentos deste executivo, pois entendemos como inadmissível que a C.M. não salvaguarde osinteresses do município do erário público:


1º A C.M. deveria, a seu tempo e há muito tempo já, ter solicitado umestudo ao Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação(INETI), para se aprofundar os seus estudos de potencial eólico para oconcelho de Bragança, quantificando a riqueza deste recurso, parasaber o que se poderá vir a negociar. Este procedimento seria útil para aC. M., para as Juntas de Freguesia e até para a Comissão de Baldios. Inclusive, serviria em caso de não instalação do parque eólico, para negociar com o estado medidas compensatórias. Mas não! Não foi solicitado qualquer estudo…


2º Consequentemente, as Juntas de Freguesia negociaram e celebraram acordos com empresas privadas, vendendo um bem do qualnão têm a mínima noção do seu real valor comercial. Bem compreendemos a sede de dinheiro que os autarcas portugueses e, em particular, os do concelho de Bragança sentem, mas por favor:


Meus Srs. e minhas Sras., passamos a vida a dizer que somos uns desgraçados e que ninguém nos liga ou auxilia e depois, quando temos um recurso próprio comportamo-nos como os mais pobres dos pobres, trocando por meia dúzia de cobres esse recurso, entregando de bandeja aos ladroes todo o ouro e riqueza. Segundo sabemos aquilo que sobrará (em forma de recompensa) para o município serão 2,5% da facturação dessa mesma exploração. Uns míseros 2,5%, que segundo a empresa interessada poderá representar a fartura de, ou até 2,5 milhões de euros por ano.


O serviço público obriga à maior solenidade com a causa pública. Não é compatível com estes interesses privados. É vergonhoso que a C. M. se tenha colado aos interesses desta empresa. Agora que sabemos que a instalação deum parque eólico dependerá da admissão deste projecto a um estatuto de Projecto de Interesse Público (famosos PINs), perguntamos se esta Câmara vai andar a exercer “loby” junto do ICNB e da Secretaria de Estado, tal como andou o presidente da Câmara de Alcochete a interceder junto daAdministração Pública e do Estado a favor do investimento Freeport!?... nuncase deveriam ter colado à Airtricity, contribuindo para o desenvolvimento do seu Marketing institucional e empresarial.


Sr. Presidente, não é de estranhar que esta empresa afirme publicamente quetem uma óptima relação com a Câmara Municipal de Bragança, enquanto que com a Câmara Municipal de Vinhais digam que não é boa nem é má, pura esimplesmente não há qualquer relação. Percebemos muito bem a necessidade que esta empresa sente em tentar agradar a todos os intervenientes, exercendo o seu “loby” através de convites para grandes almoços e jantares assim como através de reuniões realizadas fora da região.


Meus Srs e minhas Sras., não fora estarmos a falar de um parque natural e isto já estava tudo entregue… pois em termos de ordenamento do território mais difícil só mesmo em caso de um parque nacional…


Sr. Presidente, há bons exemplos alternativos de exploração destes parques eólicos por toda a Europa e resto do mundo, por exemplo na Dinamarca, naHolanda e nos EUA, onde se constituem cooperativas de proprietários de terrenos para a produção de energia e assim a totalidade do retorno é para eles próprios e suas populações. Por exemplo, a C. M. poderia ter até 49%deste negócio, em parceria e concerteza não teria qualquer dificuldade em financiar esse projecto, pois trata-se de um sector de mercado relativamente bem subsidiado e também porque qualquer banco estaria na disponibilidade de o fazer…


Esta é, Sr. Presidente, uma atitude típica de um tempo já ido, o do pós - colonialismo, no qual os espertos ocidentais aproveitavam as fragilidades de outras geografias e impunham autênticos saques. Neste caso nos seremos esses tristes e ignorantes indígenas. Esta questão relembra-me uma metáfora:algo que todos, ou quase, se devem recordar - as vacas de meias, de ganhos eperdas ou só de ganhos, que era uma prática recorrente num passado mais oumenos recente na nossa região, mas que hoje já ninguém pratica…


Para finalizar uma nota relativamente ao que foi aqui afirmado de manhã e de tarde, pelo Dr. Júlio de Carvalho que a propósito do Parque Natural e da exploração do mesmo disse que não deveríamos estar sujeitos a essa casta de fundamentalistas que impõem a sua lei e impedem o desenvolvimento da região. Pois bem, não nos obriguem a ter que escolher por uma das duas vias normais da gestão do território – ou se exploram ao máximo os recursos, ou seprotegem ao máximo, porque se o tivermos que o fazer estaremos concertezado lado de quem protege, mesmo sabendo que para os outros seremos sempre fundamentalistas e radicais.

Obrigado.

BRAGANÇA, 9 de Fevereiro de 2009

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