segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Defender o Direito à Água

Rita CalvárioA água é um recurso natural escasso e indispensável à vida e ao bem-estar das populações, desempenhando múltiplas funções sociais, culturais, económicas e ecológicas. A sua disponibilização em qualidade para consumo e a sua devolução ao meio natural, após tratamento adequado, constituem serviços essenciais de utilidade pública e interesse colectivo, que devem obedecer aos princípios da universalidade, equidade, qualidade e sustentabilidade.
A privatização dos serviços de água tem sido um caminho escolhido por muitos países, onde se inclui Portugal, com base na retórica sobre a ineficiência da gestão pública, apesar dos múltiplos exemplos de que isto é uma autêntica falácia.
Vejam-se os vários exemplos da América Latina, onde grandes lutas populares obrigaram as grandes transnacionais da água a sair de países como a Bolívia e conseguiram assegurar o direito à água como um direito humano fundamental e a imprescindibilidade da sua gestão pública na constituição em países como o Uruguai. Mais recentemente, estas lutas passam-se em países como o Equador e a Colômbia.
Mas também na Europa, além de países como a Holanda e a Bélgica se terem recusado a aceitar a privatização da água, experiências em países como a França e a Inglaterra, que optaram por concessionar os sistemas de abastecimento e saneamento a privados, tiveram péssimos resultados, vendo-se algumas regiões obrigadas a arrepiar caminho com custos económicos, sociais e ecológicos muito elevados. Recentemente, Paris decidiu remunicipalizar os seus serviços da água perante o embuste da gestão privada. Portugal tem preparado o sector da água para entregá-lo à gestão privada ao longo da sucessiva rotação partidária dos Governos. Primeiro dedicou-se aos investimentos de monta na infra-estruturação básica do País ao nível do abastecimento e saneamento, depois impôs a concentração dos sistemas em "alta" e agora dos sistemas em "baixa", colocando o bolo nas mãos das Águas de Portugal (AdP, Empresa Pública) contra as autarquias. Pelo meio vai privatizando segmentos importantes da AdP, como é o caso recente da venda da Aquapor, sub-holding para os sistemas municipais de abastecimento de água e saneamento, ou seja, oferece aos privados as concessões desses sistemas.
O Ministro do Ambiente não esconde a sua vontade. Afinal, é um homem que veio do sector e bem conhece o chorudo negócio que representa. Diz o Ministro que nesta legislatura não vai abrir o capital da holding do Estado aos privados, mas que no médio prazo isso é uma hipótese. Diz ele em entrevista ao Jornal de Negócios (5/11/2007): "Sempre defendi que a abertura aos privados deveria começar por baixo, o que está a acontecer agora com a Aquapor. No médio prazo, fará sentido abrir o capital por cima, justamente para trazer uma lógica privada macro", porque acredita, apesar das evidências empíricas doutros países, que "dão mais capital e eficiência à empresa".
Perante este cenário é preciso criar forças sociais que contrariem a privatização, seguindo o exemplo daquilo que já acontece noutros países que mobilizam movimentos populares de cidadãos, sindicatos, órgãos do poder local, e todos e todas as que defendem o direito à água.
Rita Calvário

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